sexta-feira, 15 de maio de 2009

O verão me fez recordar a infância

No final do último ano, eu estava disposta a um verão pensativo. Não gosto muito do calor estridente nem de roupas de praia e deixar à mostra minha silhueta não é algo que eu me interesso muito. Passei uns dias com a família na praia. Ainda que estivesse rodeada de seres com hormônios florescendo, guardava pensamentos e concepções únicas que eram como segredos meus. Despertados enquanto dirigia à noite, ou, até mesmo, ao observar o mar. Estava admirando a beleza do oceano, quando fui interrompida por meu irmão que gritava o meu nome e exigia atenção para brincadeiras. Meu olhar tomou outra direção e deparei-me com um rapaz, integrante chave, da minha infância. A princípio não o reconheci, depois a câmera em zoom ajudou-me a constatar que era realmente ele. Estava diferente, mais magro, mais alto, rosto fino e olhar ainda mais sério. Talvez estivesse também a guardar segredos com o mar fitando-o. Nossos olhares se tornaram um, por segundos, embora eu pense que ele não tenha me reconhecido. Gosto de lembrar de como eu o conheci. Não guardo inúmeras recordações da pré escola, e o pouco que lembro, me parece tão especial, que vez ou outra me pego lembrando, só pra testar o sabor da pureza e inocência que eu tinha. Caminhávamos em direção a escola, nossas casas eram próximas e nós éramos sim dois pequeninos. Minha mãe, a mais falantes de todos os seres, inicia uma conversa com a mãe dele. Amigas, tornaram-se naquele instante. Talvez fosse o primeiro, segundo, talvez terceiro dia de aula. Mas é certo que o ano letivo mal começara. Falavam dos filhos e, como é belo ouvir as mamães falando de seus pequenos, essas miniaturas são os orgulhos mais apetitosos. Descobriram as duas que futuramente estariam tendo a mesma conversa, afinal eu tinha uma irmã mais nova e ele também. Ele era um menino gordinho, mais baixinho que eu, e olha que nunca fui das crianças e hoje das mulheres mais altas. Cara de emburrado, nunca tivemos uma amizade muito forte.Estudamos juntos por anos, mas ele era diferente. E não era o fato de ser menino. Ele era inteligente demais, uma inteligência, que sob a minha perspectiva, era totalmente fora do comum. Nos tornamos adolescentes, vimos os progressos da vida um do outro. A última notícia que tive dele, foi de que havia prestado vestibular para medicina e que havia passado como segundo colocado. Contudo, o que marcou mesmo, foi a infância. Com ele aprendi o que é admirar, o que é ler muito e também aprendi sobre preconceito. As crianças da escola não perdoavam, e caçoavam dele por ser tão pequeno. Eu crescia, mas ele não. Nossas mães conversavam a respeito. E eu soube, por minha mãe, que ele tinha algum problema com relação a hormônio de crescimento. Eu não caçoava dele, tinha dó.A maldade da infância visitou minha porta e, com o tempo, passei a achar ele um chato por ser, como costumavam chamar, "CDF". O quarto dele era como o lugar do fantástico mundo de Bob, engenhocas e livros. Eu e minha irmã visitávamos a casa dele, eram aniversários e tardes de brincadeira na rede, que eu adorava. Ele era muito bravo, corria de um jeito estranho. E ríamos a beça. O menino inteligente, gordinho e bravo crescera.E enquanto nossos olhares se cruzaram eu recordei de tudo isso. Meu irmão percebeu que minha mente estava ausente e logo convenceu minha prima a brincar com ele na água. Voltei a olhar para o mar, e o que pensei foi que talvez hoje, ele fosse um rapaz interessante. Continuei pensando, o verão ainda não acabara e aquele olhar instantâneo, foi capaz de me fazer pensar em coisas que eu não me comprometara a pensar, todavia pensei por todo o verão.